De acordo com Maria José Fernandes, investigadora do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave e coordenadora deste estudo anual realizado com o apoio da Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC) e do Tribunal de Contas, 218 dos 308 municípios conseguiram baixar em 2020 a respetiva dívida a pagar, contribuindo para um decréscimo global do passivo exigível municipal em 138 milhões de euros.

“Verificamos que há uma ligeira baixa no que são alguns dos setores das receitas autárquicas, também muito fruto, eu penso, da questão da pandemia, mas há de facto indicadores muito positivos”, considerou.

Em destaque esteve também, em 2020, “a diminuição da dívida, em termos globais, de todo o setor, quer dos municípios, das empresas municipais e dos serviços municipalizados”, em cerca de 100 milhões de euros.

No ano passado, verificou-se “um maior número de amortização de empréstimos bancários do que propriamente o recurso a novos empréstimos bancários” e “mais de metade dos municípios apresentou um volume de receita efetiva superior ao volume da despesa efetiva”.

“A diferença entre o volume das amortizações de capital em dívida e o montante de novos empréstimos foi +208 milhões de euros, contribuindo o setor autárquico de forma muito positiva para a diminuição líquida do passivo financeiro do Estado”, sublinhou.

A investigadora realçou que esta situação se verificou apesar “do acréscimo de despesa que os municípios, sobretudo em termos sociais, incorreram e também naturalmente de alguma diminuição de receita”.

“Relativamente àquilo que é a receita cobrada, verificamos que há uma baixa de impostos e taxas, mas que é compensada também pelas transferências, que têm um volume maior, quer correntes, quer transferências de capital”, disse.

Em termos de impostos diretos, o IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis) aumentou muito ligeiramente (0,6%) e o IMT (Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis), tal como a derrama (imposto municipal que incide sobre o lucro tributável das pessoas coletivas), teve uma descida, “mas também não significativa”.

Os municípios pagaram 84,1% dos compromissos assu­midos: 67 municípios apresentaram uma taxa de paga­mento de compromissos superior a 90% e 287 municípios apresen­tam uma taxa de pagamentos de obrigações superior a 90%.

O volume da despesa paga foi, no total, de 8,8 mil milhões de euros, representando um aumento ligeiro de 0,8% (+72,5 mi­lhões de euros), tendo sido o valor mais elevado nos últimos 11 anos.

Com o aumento da despesa e a redução da receita, nos fluxos de caixa o volume das despesas pagas superou em 3,5 milhões de euros o volume de receitas cobradas, mas foi possível um equilíbrio “com a mobilização do saldo da gerência anterior”.

Num ano de pandemia, mas em que se aproximava o horizonte de eleições autárquicas, o investimento direto dos municípios totalizou 2.720 milhões de euros, um aumento de 13,1% (+314,9 milhões de euros).

Do total dos municípios, 206 apresentaram um au­mento do montante global de investimento direto e indireto, que em 74 deles foi mesmo superior a 50%.

Tendo como referência a despesa prevista, o grau de execução da despesa paga no final de 2020 foi de apenas 73,3%, apresentando “o decréscimo pouco significativo” de -1,6 pontos percentuais (pp) face ao ano anterior.

Segundo o documento, entre 2010 e 2020 verificou-se “uma enorme evolução dos saldos orçamentais”: no ano passado, “pela sexta vez consecutiva no conjunto dos municípios” verificou-se “um saldo efetivo e um saldo primário positivos, quando obtidos pela diferença entre receitas liquidadas e compromissos assumidos”, tendo contribuído para um saldo orçamental positivo de 149 municípios.

No ano passado, as despesas com pessoal continuavam a liderar no bolo das despesas autárquicas, representando, em média, 31,2% do total global.

Em 2020 há ainda a destacar resultados negativos de 143 municípios que os investigadores justificam “essencialmente com alterações de critérios de registo contabilístico devido à implementação do SNC-AP [Sistema de Normalização Contabilística – Administrações Públicas] e não a alterações significativas da estrutura económica dos municípios”.

Câmaras cobraram menos impostos e taxas em 2020, para 3.446,7 milhões de euros

Segundo o documento, 2020 “foi, ainda assim, um bom ano de receita fiscal”, apesar deste decréscimo de -3,4%, “pois apresentou, na globalidade, uma execução orçamental de 101%, arrecadando na totalidade 3.446,7 milhões de euros, isto é, +35,1 milhões de euros que o previsto”.

Os investigadores que analisaram as contas dos municípios em 2020 salientam que as receitas fiscais continuam a ser a maior parcela de receita das autarquias, representando 39,3% na receita total, “embora este peso varie com a dimensão do município”.

“Em 2020, nos municípios de pequena dimensão esta média situou-se em 16,1% da receita total, nos municípios de média dimensão subiu para 37,1% e nos de grande dimensão para 57%”, é sublinhado no Anuário Financeiro, que hoje será divulgado numa conferência organizada pela Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC).

No documento é salientado que “para esta boa realização fiscal contribuíram, essencialmente, os impostos diretos”, o IMI, IMT, Imposto automóvel e derrama, porque, apesar de um ligeiro decréscimo de 1,2% em relação a 2019, para 3.103,8 milhões de euros, apresentaram uma taxa de execução orçamental de 102,7%.

A coleta dos impostos indiretos representou o total de 41 milhões de euros (um decréscimo de 75,3%) e “teve uma repercussão negativa no total da coleta fiscal” em relação ao que tinha sido perspetivado em termos de previsões orçamentais.

Já em taxas, multas e outras penalidades, os municípios encaixaram mais 40,4 milhões de euros (+15,4%) face ao ano de 2019.

Em relação aos impostos diretos cobrados, apenas o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) teve em 2020 uma variação positiva de cerca de 0,6% ao registar uma receita de 1.497,2 milhões de euros (+8,2 milhões de euros), contribuindo para 48,2% dos impostos diretos cobrados.

Os autores do Anuário destacaram ainda que em 2020 foram 262 os municípios que decidiram não reduzir a taxa de IMI cobrada aos respetivos munícipes, mas mesmo assim 40 destes receberam menos no montante que foi cobrado.

Por outro lado, outros 46 municípios decidiram baixar a taxa de IMI a aplicar nas cobranças de 2020, mas, apesar disso, seis deles conseguiram aumentar o que receberam desta coleta em relação ao ano anterior (Covilhã, Alcanena, Moita, Santiago do Cacém, Loures e Montemor-o-Velho).

Depois de anos de recuperação, o Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas (IMT) baixou ligeiramente, -35,8 milhões de euros (-3,5%) em 2020, para totalizar 974,6 milhões de euros.

Para esta descida do IMT contribuíram sobretudo os municípios do Porto (-11,8 milhões de euros, -18%) e Albufeira (-8 milhões de euros, -38%), é realçado no Anuário.

Apesar deste decréscimo, o IMT representou 31,4% do total dos impostos diretos obtidos pelo conjunto dos municípios em 2020.

Já a derrama, em 2020 voltou a descer (-2,1%, -7,4 milhões de euros), ao apresentar o volume de coleta de 346,8 milhões de euros, representando 11,2% do total dos impostos diretos.

Depois de um período de crescimento desde 2017, o imposto automóvel, que também cabe aos municípios, apresentou em 2020 uma ligeira variação negativa de 1,2% (-3,5 milhões de euros), ao totalizar 283,7 milhões de euros.

Loulé, Nazaré, Lisboa, Porto Santo, Mafra e Vila Real de Santo António foram os municípios com maior peso dos impostos recolhidos na receita total em 2020.

O montante global da receita cobrada pelos municípios em 2020 diminuiu 3% (-268 milhões de euros que em 2019) para o montante de 8.773,1 milhões de euros.

O Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses é realizado numa colaboração entre a Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC), com o apoio do Tribunal de Contas, e o Centro de Investigação em Contabilidade e Fiscalidade do IPCA-Instituto Politécnico do Cávado e do Ave. Vai ser apresentado hoje durante uma conferência, a partir das 10:00, disponível ‘online’ neste link.