O Presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi, afirmou na sexta-feira, em Maputo, que o "líder dos terroristas" no país -- referindo-se a Bonomade - foi "colocado fora de combate", mas alertou que a luta contra o terrorismo continua.

"Está-se a fabricar um vilão e a cantar grande vitória, como se isto significasse o fim da guerra", mas a causa da guerra são "as condições sociopolíticas" prevalecentes na província de Cabo Delgado, norte de Moçambique, onde Bonamade Machude Omar operava e foi morto, afirmou à Lusa João Feijó, investigador do Observatório do Meio Rural (OMR), organização não-governamental (ONG) e autor de vários trabalhos sobre a violência armada naquele ponto do país.

Feijó manifestou "dúvidas" sobre o impacto da morte do líder da insurgência na ação de grupos armados, assinalando que a rebelião constitui uma ressonância da revolta da população de Cabo Delgado e do norte de Moçambique em relação à exclusão social, económica e política, num contexto de abundância de recursos.

"Ele [Bonomade Machude Omar] não é a causa da guerra, mas as condições sociopolíticas locais. Não creio que [a sua morte] vá mudar grande coisa", enfatizou.

De acordo com João Feijó, para o Presidente da República, Filipe Nyusi, a eliminação física do líder da insurgência "é útil, porque conseguiu um troféu", face ao descontentamento social - com expressão visível em greves como na saúde -- aproximação das eleições autárquicas de 11 de outubro e clivagens na Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder, prosseguiu.

O analista alertou para o risco de o triunfalismo sobre a morte de Bonomade Machude Omar produzir "um mártir e propiciar a emergência de um substituto radical, porque o líder morto tem seguidores fanáticos, que permitiram que ele sobrevivesse em vários anos de insurgência".

"É vilão para uns e heróis para outros", enfatizou.

Aquele investigador notou que a morte de Bonomade Machude Omar pode desarticular a capacidade operativa dos grupos armados na província de Cabo Delgado, dado o carisma e as habilidades táticas do falecido líder, mas permanece uma incógnita o futuro da rebelião, em termos de atuação no terreno.

Borges Nhamire, investigador do Instituto para Estudos de Segurança (ISS, na sigla em inglês), uma entidade africana independente sobre estudos de segurança, também alertou que a liquidação do líder da insurgência não vai resultar automaticamente no fim do conflito em Cabo Delgado, podendo, até, levar a um recrudescimento.

"A morte do líder não significa necessariamente o fim da insurgência", sublinhou Nhamirre.

A analogia com outros grupos que combinam o radicalismo islâmico e a revolta social das comunidades em que operam mostra que tem havido condições para a substituição dos líderes que são mortos, assinalou.

Observou que, em termos puramente militares e operacionais, a insurgência em Cabo Delgado vai passar por um "período de desorientação", tendo em conta a preponderância atribuída a Bonomade Machude Omar na estratégia da insurgência.

Borges Nhamire notou que a proeminência de Omar nos grupos armados que protagonizam ataques na província de Cabo Delgado explica-se no facto de constar da lista de líderes e grupos terroristas de Moçambique, Estados Unidos da América (EUA) e da União Europeia.

A notícia da morte de Bonomade Machude Omar, juntamente com outros elementos da liderança do grupo terrorista, foi primeiro dada, na sexta-feira, pelo chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas de Moçambique, Joaquim Rivas Mangrasse.

"Da averiguação feita, e ela ainda continua, foi constatado, com evidências factuais, a colocação fora de combate do líder principal que dirige as operações desde a eclosão do terrorismo em Moçambique, o moçambicano Bonomade Machude, conhecido como Ibn Omar nas matas, conhecido também por Abu Suraka", anunciou, numa declaração à imprensa, no quartel de Maringanha, em Pemba, o general Joaquim Rivas Mangrasse.

O conflito no norte de Moçambique já fez um milhão de deslocados, de acordo com o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), e cerca de 4.000 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED.

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