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Newsletter diária • 25 mar 2024

 
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Português, luta? Sim, mas não nos obriguem a ir para rua gritar

 
 

Edição por Ana Maria Pimentel

Nos últimos meses o dia-a-dia foi marcado por manifestações e protestos. Mas terão sido mesmo? Antes e durante o período eleitoral vimos os polícias na rua, os agricultores em marchas lentas, diferentes classes profissionais a exigirem melhores condições e tinta atirada e estradas cortadas em nome da justiça climática. Até as eleições, dizem, foram marcadas pelos votos de protesto.

E se há uma figura incontornável representada em tantos portugueses, o Velho do Restelo, há outra sempre pronta para a contestação, o Zé Povinho. Mas, segundo um estudo da Amnistia Internacional, parece que estamos a ficar com pouco de um e de outro. E os protestos são cada vez menos na rua.

Apenas 10% dos inquiridos num estudo da Amnistia Internacional participou numa manifestação nos últimos cinco anos e quase metade acha que estes eventos têm de ser organizados, havendo 35% que defende a criminalização da desobediência civil. Os resultados do inquérito mostram que 90% das pessoas não participou em qualquer manifestação desde 2018, estando aqui incluídos não só protestos mais tradicionais, como desfiles e greves, mas também reuniões de assembleias de freguesia, por exemplo.

Por outro lado, quase metade dos inquiridos (47%) acha que estas ações têm que ser autorizadas, apesar de a Constituição Portuguesa ser clara quando refere que “os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização”.

Importa lembrar que uma das críticas feitas à manifestação dos polícias na noite do debate eleitoral entre Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos foi, entre outras, esta não ter sido autorizada. O protesto junto ao Capitólio foi marcado nas redes sociais pelo ‘movimento Inop’ e não teve a participação da plataforma que congrega sindicatos da PSP e associações da GNR. A comandante responsável pelo policiamento junto ao Capitólio disse, na altura, à Lusa que a manifestação não estava autorizada.

Se, por um lado, 82% dos inquiridos que protestaram afirmou que nunca sentiu os seus direitos enquanto manifestante serem limitados. E 84% acredita que as manifestações são importantes para o debate de ideias numa democracia, as opiniões dividem-se quando a questão é a desobediência civil, em que entram ações como o corte de estradas, o bloqueio de aviões ou a pintura de fachadas de edifícios.

O que nos leva de imediato para os protestos dos ativistas pelo clima que têm sido criticados da esquerda à direita, nomeadamente o que ocorreu com Montenegro durante a campanha eleitoral, ou o a Duarte Cordeiro quando tentava intervir numa conferência.

Se os portugueses pedem e preferem que não os obriguem a ir para a rua gritar, já os franceses estão na ponta diametralmente oposta e ainda hoje, a quatro meses dos Jogos Olímpicos, a pressão começa a aumentar nas ruas de Paris: desde uma "dança antirracista" para defender a cantora Aya Nakamura até ativistas que fazem as estátuas da cidade 'falarem' sobre a situação das pessoas nas ruas.

Contudo, no atual contexto político e nos 50 anos do 25 de abril importa lembrar que mesmo que os portugueses não saiam muito à rua, quando o fizeram foram cirúrgicos. Como disse Isabel do Carmo este fim-de-semana ao SAPO24:

"O que eu acho é que não nos podemos entregar à desgraça. Ser fatalistas. Em Portugal, o 25 de Abril, feito no meio da Europa, por militares, não era imaginável. Agora, a posteriori podem interpretar como quiserem, mas foi um caso único. Havia muita gente com esperanças no Marcello e, de repente, surge uma coisa daquela amplitude, que atraiu uma grande parte da população, foi uma surpresa. Portanto, é melhor não nos entregarmos ao fatalismo, porque pode haver boas surpresas. Nesse sentido, é bom que as pessoas defendam aquilo em que de facto acreditam. Não é coisas fantasiosas. Não é, quem não gosta dos bancos, agora vamos atacar os bancos. (Embora o Chega já tenha dito que atacava os bancos, saiu-lhe aquilo.) Não é um confronto direto com os mais poderosos ao nível financeiro. Mas é mantermos as coisas em que acreditamos, algumas são exequíveis. Manter a esperança."

*Com Lusa
 
 
 
 
 
 

 
 

No episódio desta semana do podcast Acho Que Vais Gostar Disto, falou-se sobre "The Gentlemen: Senhores do Crime: A Série", o novo sucesso da Netflix que recupera o swagger gangster do filme homónimo de Guy Ritchie.

 
 
 
 
 

 
 

Maria Duran teve uma vida atribulada. Nascida por volta de 1711 em Prullans, uma aldeia montanhosa a norte do vale do rio Segre, na Catalunha, casou aos 14 anos com Ignacio Sulsona, um pastor e lavrador muito mais velho do que ela que tinha contraído sífilis. Assim que lhe foi possível, fugiu. Passou pelo Sul de França e por Barcelona, onde, assumindo uma identidade masculina, integrou o Exército espanhol como soldado, após o que se mudou para Madrid. Mais tarde, viajou para Portugal, e, como mulher, deu entrada em diferentes recolhimentos, casas religiosas que recebiam mulheres desamparadas. Nestes espaços, manteve relações sexuais com outras recolhidas e também com freiras. Acusada de ser um homem, suspeitou-se de que teria feito um pacto com o Diabo, o que levou à intervenção do Santo Ofício. Em 1741, três anos após ter chegado a Portugal, Maria Duran foi presa. A Inquisição levou a cabo uma morosa investigação com recurso à tortura e um longo julgamento para determinar se a catalã era homem, mulher ou «hermafrodita». Após ter passado três anos nos calabouços do Santo Ofício em Lisboa, na zona do Rossio, Maria Duran, que sempre afirmou ser mulher, foi condenada publicamente num auto de fé por ter firmado um pacto com o Diabo que lhe permitia seduzir mulheres. Acabaria por ser libertada e expulsa do reino, não se sabendo o que lhe aconteceu depois. Esquecida durante séculos, a extraordinária história de Maria Duran é agora recuperada em "A Hermafrodita e a Inquisição Portuguesa – O Caso Que Abalou o Santo Ofício", do investigador de origem francesa François Soyer, que a descobriu «por acaso» enquanto realizava uma pesquisa no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, em Lisboa. O SAPO24 publica um excerto desta obra, já nas livrarias.